Não consentem os deuses mais que a vida, Poema de Ricardo Reis (Fernando Pessoa)
Não consentem os deuses mais que a vida
Não consentem os deuses mais que a vida.
Tudo pois refusemos, que nos alce
A irrespiráveis píncaros,
Perenes sem ter flores.
Só de aceitar tenhamos a ciência,
E, enquanto bate o sangue em nossas fontes,
Nem se engelha connosco
O mesmo amor, duremos,
Como vidros, às luzes transparentes
E deixando escorrer a chuva triste,
Só mornos ao sol quente,
E reflectindo um pouco.
Texto publicado por Fernando Pessoa na primeira edição da revista Athena, outubro de 1924, p. 19-24.